Boa descoberta ao acaso define bem o encontro com esse livro, que lá da prateleira do sebo me fisgou, piscou pra mim e não teve jeito, levei. Li, amei. A autora tem uma escrita simplesmente maravilhosa, poética, cativante e envolvente. Os dois protagonistas nos cativam com suas histórias, suas realidades. Rosálio e Irene. O primeiro, pedreiro. A segunda, prostituta infectada pela Aids. Características essas simplistas demais para demonstrar a complexidade de cada um. Ambos se encontram um dia. Rosálio precisava de alguém que o ouvisse, e Irene buscava alguém que a desejasse de verdade. E desde o primeiro encontro, um demonstrou a possibilidade de completar aquilo que faltava no outro. Rosálio sonhava em ler e escrever, desde pequeno, mas a vida foi ingrata com ele sem nunca ensiná-lo. O que ele tinha era amor pelas histórias, e histórias reais e inventadas que faziam completar a vida já sem esperança de pessoas como a Irene. Irene sabia ler e escrever, e pôde realizar o sonho de Rosálio. Quase todos os dias eles se encontravam, Irene o ensinava a escrita e Rosálio a agradecia com suas histórias. E assim a vida cinza dos dois foi ganhando cor, preenchida a cada capítulo por títulos como: cinzento e encarnado, roxo e branco, vermelho e prata, azul e amarelo. Muito bonito de ver como é dado valor na palavra, nas narrativas orais e também nas escritas, em como é possível vidas e mundos inteiros se transformarem com a mágica das palavras. Uma ode à literatura, às histórias e à educação.
Maria Valéria Rezende foi um presente muito bom nesse ano, deixando um gostinho de quero mais com suas palavras:
"Enquanto eu era pequeno, não sabia que era triste a minha vida, nãp imaginava outra e por isso não podia saber da minha desgraça. Pois a desgraça é assim, se a gente não sabe nem fala que ela está ali presente, ela quase não existe e já depois que se disse ainda é preciso tempo, contar tudo muitas vezes, pra poder pegar o jeito de se sentir infeliz."
"não diga tanta besteira que o amor não é assim, o amor é como menino que não sabe fazer contas nem de perda nem de ganho, vive descautelado, não tem lei, não tem juízo, não se explica nem se entende, é charada e susto, mistério. "
"Rosálio atende, contente, o pedido da mulher, porque relembrar sua vida lhe permite reviver, agora sem dor, de longe, as coisas que aconteceram e descobrir seus sentidos, cada vez vendo mais fundo o mundo como ele é."
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